terça-feira, dezembro 13, 2005

ABUSO SEXUAL NA INFÂNCIA

Há uma absurda quantidade de preconceitos e de hipocrisia na maneira com que a maior parte do “establishment” lida com a questão do chamado “abuso sexual na infância”. Tenho suficiente experiência clínica – atuando há cerca de quarenta anos não só como psicoterapeuta como enquanto supervisor de outros psicoterapeutas – para estar absolutamente convencido de que a maioria esmagadora dos que lidam com a matéria – familiares, juristas, psico-coisas (psiquiatras, psicólogos, psicoterapeutas,.psicanalistas et caterva), assistentes sociais etc. não são capazes de diferenciar os dois grandes sub-conjuntos de episódios que compõem o que se convencionou chamar de “abuso sexual na infância”. Tal experiência ensinou-me simplesmente o seguinte: se nos aproximamos do tema de maneira suficientemente isenta, descobriremos não só o tipo de abuso universalmente reconhecido – aquele em que a criança é a real vítima de uma arremetida sexual desagradável, desrespeitosa e violenta – como também o praticamente não reconhecido em que a abordagem sexual de um adulto em relação a uma criança foi, para essa última, agradável, respeitosa e gentil. Creio ser suficientemente neutro em minha avaliação dos fatos, para que várias pacientes me tenham relatado que foram, em sua infância, sexualmente abordadas por adultos e que, embora obrigadas pelas circunstâncias a manter segredo (o que é suficiente para produzir fixação e trauma, como exponho em meu livro “A Nova Conversa”), adoraram isso! Algumas dessas pacientes (e, por agora, estou deixando os meninos de lado), chegaram a me relatar que tinham aqueles momentos como um oásis de prazer e de carinho dentro de um contexto em que se sentiam de todo abandonadas. Pelo menos duas dessas pacientes relataram como, ao ser bolinadas – uma pelo tio, outra pelo pai – ficavam ansiando pela penetração do pênis em suas vaginas. Uma jamais externou esse desejo a seu “abusador”; a outra pediu explicitamente ao pai que a penetrasse, o que o deixou em pânico, parando de sexualmente abordá-la. Agora, reflitamos um pouco, aproveitando, para análise, a experiência da primeira. Descobriram que o tio a bolinava. O escândalo foi absoluto e o tio foi execrado, enquanto todos os familiares descreviam a menina como “coitada”, “coitada”, “coitada” (imagino que a maioria de meus leitores saibam que o termo “coitado” vem de “coito”)! Alguém acredita que, em tais circunstâncias, uma criança de 10 anos tivesse condições psicológicas para declarar: — “Pessoal, eu não sou nenhuma vítima! Eu estava gostando! Só fiquei chateada porque ele não teve coragem de enfiar o pau dele em mim!”? Um pouco difícil, não? Tal declaração, quando chega a acontecer, só pode ser feita, via de regra muitos anos depois, a um psicólogo que não seja preconceituoso nem hipócrita!

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