sábado, fevereiro 08, 2014

O ALFA E O ÔMEGA DA PSICANÁLISE

Em janeiro de 1893, publicava-se, numa revista de neurologia, em Berlim, a seguinte sequência de palavras, não obstante perdidas em meio a um parágrafo de sintaxe bastante arrevesada, creio, até para um falante nativo do alemão:

“descobrimos ... que os sintomas histéricos... desapareciam ... quando ... o enfermo ... dava... da forma detalhada mais detalhada possível ... palavras à emoção”.

Se a descoberta correspondesse aos fatos – e corresponde – e pudesse ser estendida – e pode – para além dos limites da histeria, abrangendo todos os demais quadros neuróticos, seria apenas necessário desenvolver técnicas, as mais eficazes possíveis, para servir a essa estratégia, cujo objetivo simples, claro e chão é permitir, da forma mais rápida e duradoura possível, que um paciente “dê palavras, o mais detalhada possível, a suas emoções” para que portentoso desenvolvimento fosse dado à cura da neurose.

E o que aconteceu? Vejamos.

Uma instituição, frequentes vezes, não passa de uma inflamação, criada em torno de uma ideia, para sufocá-la. A Igreja Católica e o Partido Comunista são acabado exemplo disso. As Sociedades Psicanalíticas parecem ter pretendido, e com sucesso, seguir-lhes fielmente as pegadas e, dentro delas, as palavras, não há dúvida, se multiplicaram, se multiplicaram, se multiplicaram e continuam se multiplicando, se multiplicando, se multiplicando... Desafortunadamente, ocorreu um pequeno deslize e as palavras que se multiplicaram e se multiplicaram e se multiplicaram foram as dos analistas, não as dos pacientes, e, visto não encontrado nada mais tão espetacular assim para ser dito, suas novas palavras foram progressivamente soterrando, soterrando, soterrando aquelas palavras simples e brilhantes, que tinham algo fundamental a dizer, mas que acabaram cinzas, quase silenciadas, sob a poeira de nada que sobre elas se depositou.

E eu, o que tenho de novo e brilhante a dizer? Nada. Então, já que não tenho, vou repetir:

“Se os pacientes forem auxiliados pelos seus psicanalistas, por meio de não importa qual, a dar, de forma mais detalhada que possível, palavras às suas emoções, seus sintomas neuróticos desaparecem”.

Simples, não? Pois é...

[Bem, para quem gosta do alemão e o entende: as palavras garimpadas por mim fazem parte do trecho seguinte, e estão por mim maiusculadas:

„WIR FANDEM nämlich, anfangs unserer gröβten Überraschung, daβ DIE einzelnen HYSTERISCHEN SYMPTOME sogleich und ohne Wiederkehr VERSCHWANDEN, WENN es gelungen war, die Erinnerung an den veranlassenden Vorgang zu voller Helligkeit zu erwecken, damit auch den begleitenden Affekt wachzurufen, und wenn dann DER KRANKE den Vorgang in MÖGLICHKEIT AUSFÜRLICHE WEISE Weise schilderte und DEM AFFEKT WORTE GAB. Affektloses Erinnern ist fast immer völlig wirkunglos.“ Breuer, J. & Freud, S. „Über den Psychischen Mechanismus Hysterischer Phänomene“. Berlin: Neurologisches Zentralblatt, Janeiro, 1893, vol. 12 (1). Os autores também parecem dar especial importância ao trecho, pois, algo raro na obra freudiana, todo o trecho, excetuada a última oração, vem em itálico no original)].
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