segunda-feira, janeiro 02, 2006

DIÁLOGOS LOGANALÍTiCOS I: O PROBLEMA DA SOPA

PEDRO: — Meu bem, esta sopa está fria!
CLÁUDIA: — Eu sei que tudo que eu faço é mal feito! Talvez fosse melhor para você que a gente se separasse!
PEDRO: — Eu preferiria que você esquentasse a sopa...

O objetivo de minhas contribuições a este espaço é voltar nossa atenção para detalhes das comunicações interpessoais que, por serem desatendidos, impedem um manejo mais produtivo das relações entre nós, humanos. O formato que, por ora, escolhi para essas contribuições é descrever um pequeno fragmento de diálogo representativo de dificuldades de comunicação freqüentes em nossa cultura e, em seguida, explicitar a natureza dessas dificuldades e sugerir como lidar com elas. Nesse espírito, voltemo-nos sobre o fragmento acima.Um bom diálogo interpessoal – refiro-me, naturalmente, aos que dizem respeito a nossas relações íntimas e cotidianas, não a que tipifica uma aula de Matemática – é MICROSCÓPICO e, não, MACROSCÓPICO. Exemplifico: Afirmação macroscópica: — Você NUNCA me amou!Afirmação microscópica: — ONTEM, NA FESTA DE ANIVERSÁRIO DA ANA, eu me senti rejeitada quando você não me apresentou a seu chefe. O grande problema das afirmações MACROSCÓPICAS é que elas não oferecem condições para nenhum manejo eficaz do problema supostamente em pauta. Na verdade, de maneira geral, uma pessoa que, frente a afirmação de que uma sopa está fria, reage dizendo que “Eu sei que TUDO que eu faço é mal feito!” está consciente ou inconscientemente agindo de maneira desonesta: está tentando desviar a conversa de um universo microscópico em que a sopa está fria – e que pede a óbvia providência de que se a esquente – para um universo macroscópico em que é difícil divisar algo que, de fato, possa ser feito. Essa é uma armadilha freqüente nos diálogos que habitam nosso cotidiano. Naquele – em verdade, fictício – que relatei acima, Pedro consegue não cair nessa armadilha. Percebe a matreira passagem do nível microscópico para o macroscópico e volta para o primeiro. Isso não é comum. O mais das vezes, a partir do “Eu sei que tudo que eu faço é mal feito! Talvez fosse melhor para você que a gente se separasse!”, o que ocorre é o início de uma discussão estéril e infindável, que se repete monotonamente – muita vez diante de cansados filhos – ao longo de anos e anos, para um indiscutível prejuízo de todos. E da sopa.

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