domingo, junho 24, 2007

DIÁLOGOS LOGANALÍTICOS XXIV: CINDERELAS DO DIA

Meninas de rua de Ipanema são “CINDERELAS DO DIA”: assemelham-se à do conto infantil por ter um vida dupla, mas, divergem daquela em relação a horários. Vejamos como:
À noite vivem seu aviltamento – ora dormem ao relento, no duro chão das calçadas, ora arriscam voltar a suas casas nas favelas, o mais das vezes para receber pancadas e maus tratos de pais bêbedos, drogados e marginais.
Ao amanhecer do dia, particularmente no verão, entram numa abóbora transformada em carruagem – uma prancha de surf tirada de não sei onde – e vão-se divertir deslizando sobre as águas do Arpoador. Chegada a fome, conseguem regularmente que a população enricada da área lhes pague alguns suculentos cheeseburgers ou redondos pratos-feitos, que comem gostosamente em grupo, geralmente regados por uma coca de dois litros, que dividem entre si. Depois? Depois, praia outra vez.
Voltada a noite, num passe de mágica que não compreendo, as pranchas-carruagem desaparecem e elas mergulham novamente no borralho das favelas e calçadas, certamente sonhando com a praia-palácio a que retornarão quando o dia voltar.
Observo-as bastante e pretendo saber relacionar-me com com elas. Uma vez, por exemplo, roubaram-me sem que eu visse vinte pratas de troco que estavam em cima do balcão de um bar. Eu disse que não falaria mais com elas enquanto o dinheiro não voltasse. Confessaram o “crime”, disseram que já tinham gastado o dinheiro, mas que iam conseguir de novo para me devolver. Fizeram isso. Com um bastante tolerável atraso de 48 horas.
Saboreemos o diálogo que travei com uma delas num de seus faustosos momentos de princesa lúdica, durante de uma tarde luminosa de verão:

MENINA PEDINTE: — Me dá dez reais aí!
EU: — Não dou!
MENINA PEDINTE: — Você não tem?
EU: — Tenho mais do que isso.
MENINA PEDINTE: — Então por que não dá?
EU: — Porque estou de mau humor!
MENINA PEDINTE: — Então me dá sete.
EU: — Qual o mínimo que você está aceitando hoje?
MENINA PEDINTE: — Ué, sete!
EU: — Dou dois!
MENINA PEDINTE: — Dois é muito pouco!
EU: — Tem razão! Eu ficaria ofendido se me alguém se oferecesse a me dar só dois reais!
MENINA PEDINTE: — Então me dá sete.
EU: — Só dou dois.
MENINA PEDINTE: — Tá bem. Eu fico com dois.
EU: — Tem certeza? Acho um pouco ofensivo...
MENINA PEDINTE: — Não, tá bom. Me dá.
EU (passando os dois reais): — Pega aí, mas eu não receberia...
MENINA PEDINTE (saindo, toda serelepe, na direção das amiguinhas, que esperavam adiante): — Tchau!
EU (rindo por dentro): — Tchau!...

É mole?

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