segunda-feira, junho 25, 2007

DIÁLOGOS LOGANALÍTICOS XXVII: PERDA

Mais uma vez, transcrevo um diálogo travado via imeil:

“Luís César Ebraico, como vai o Senhor?
Tenho buscado muito sobre o tema, luto, perda de entes queridos. Muito se fala, sobre perda de filhos, tendo esse como o luto mais sofrido. Sou mãe e avalio que seja mesmo, mas, aos onze anos sete meses e doze dias de idade, perdi minha mãe, sou filha única, meu pai logo casou-se de novo, vivi sempre com meus avos maternos desde então e agora, aos 54, perdi minha avó, com quem sempre convivi – ela sempre morou comigo mesmo depois de meu casamento – e percebi, com isso, que vivo um luto crônico da perda de minha mãe, e está muito difícil viver agora a perda de minha avó. Estou estudando muito o assunto luto, mas me pergunto por que se fala tão pouco sobre o luto na infância, perder a mãe ou o pai, marca-nos pelo resto da vida.gostaria de uma palavra do senhor a respeito e onde encontro literatura, apropriada ao luto na infância. Agradeço muito sua atenção. Um abraço, Patrícia.”

Minha resposta:

“Patrícia,
Vamos ver o quanto posso ajudar dentro dos limites que permite uma troca de imeils. Tentemos o seguinte: sugiro, primeiro, que você dê uma olhada em outros dois diálogos deste blogue, o de número VII, Intitulado "LUTO", e de número VIII, intitulado “KÜBLER-ROSS”. Esses dois “DIÁLOGOS” falam de perda e sua mensagem essencial é a de que:
1) Toda a perda é frustrante e TENTAR NEGAR ISSO NÃO É SAUDÁVEL;
2) O que é fundamental é que se impeça que a “frustração” da perda se transforme em “trauma”;
3) Uma diferença fundamental entre frustração é trauma é que a dor da primeira se mantém localizada onde a ferida ocorreu – por exemplo, se alguém que gosta de jogar futebol tem uma perna amputada, sofre por não poder mais fazê-lo da forma que anteriormente fazia – a dor do trauma, por sua vez, contamina, como uma metástase, praticamente todas as áreas da vida do sujeito, atingindo áreas que, na verdade, não foram diretamente atingidas – por exemplo, esse mesmo sujeito que perdeu sua perna, não apenas tem seu futebol atingido, mas também sua vida sexual, afetiva, social, profissional etc.;
4) O “segredo” para que se impeça que uma frustração – por maior que ela seja – se transforme em trauma é atravessar com sucesso um processo de luto, cuja essência é a de O DIREITO DE SOFRER da pessoa que foi vítima da perda NÃO SEJA INVALIDADO;
5) Maiores esclarecimentos sobre as diferenças entre “frustração” e “trauma” e sobre as maneiras de impedir que a primeira se transforme nesse último podem ser encontrados no meu livro “A Nova Conversa” (Rio: Ediouro, 2004);
7) Em tempo: o fato de a perda haver ocorrido na infância pode torná-la mais impactante, mas a forma de lidar com ela é, em qualquer idade, essencialmente a mesma: é proibido ILEGITIMAR A DOR daquele que está sofrendo. Tenho mais de um caso em que observei as desastrosas conseqüências de mães que, com as melhores das intenções, mas sem conhecimento adequado, tentaram calar a dor de um(a) filho(a) que perdeu – por falecimento, por divórcio etc. – o pai, dizendo que não se preocupasse, pois ela, mãe, passaria a ser pai e mãe ao mesmo tempo. Uma chegou a dizer ao filho que ela ia ser “pãe” ( = pai e mãe ). Não deu certo, nem poderia dar. Essas vítimas de boas intenções ou ficam traumatizadas para sempre ou vão ter que enfrentar com a ajuda de um terapeuta a dor que lhes foi impedido sentir quando ela originalmente ocorreu;
8) Um último comentário. Você disse que é mãe. NÃO IMPEÇA SEUS FILHOS DE SOFRER, QUANDO ELES TIVEREM UMA PERDA, nem que seja tão pequena quanto a de uma bola de gude. Escute-os simplesmente e mostre que está ao lado deles. Diga algo como: “Que chato meu filho! Posso fazer alguma coisa por você?” Já vi crianças responderem: “Não, mamãe, tudo bem, eu só queria falar como eu fiquei chateado!” Isso vai permitir que seu filho siga adiante, sem ficar fixado para sempre – trauma sempre implica fixação! – na lembrança de uma bola de gude.”

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